quinta-feira, agosto 31, 2006

A Ideia de Europa - George Steiner


Esta coisa da identidade sempre me deu que pensar.
"Quem sou eu" é a interrogação que me acompanha desde sempre e a pergunta-de-fazer-doer-a-cabeça mais remota de que tenho memória. Outras houve como "porque é que o Gabriel tem um cão e nós não" ou mais recentemente "porque é que nunca arranjo lugar para estacionar o carro" mas o mais provável é que se vão relativizando com o passar dos anos e não subsistam como a questão da identidade, do abismo que é pensar no que me define em relação ao Outro, enquanto pessoa, enquanto portuguesa, enquanto europeia (e por aí adiante). No que respeita a este último lugar, George Steiner n´ A Ideia de Europa ajudou-me (de uma forma muito prazeirosa) a arrumar razões.
Neste pequeno ensaio, George Steiner percorre os 5 axiomas que julga poderem definir a Europa relativamente ao resto do Mundo (especialmente em relação aos EUA). Um desses axiomas é a soberania da lembrança, "as ruas e praças nomeadas segundo estadistas, cientistas, artistas e escritores do passado". Há um in memoriam constante nos espaços que habitamos, "verdadeiras câmaras de ressonância de feitos históricos". E aqui a oposição com os EUA, onde as ruas são designadas ora por números, ora por nomes de árvores, raramente referenciando o passado. Não vemos ali esta soberania da lembrança que tanto nos caracteriza, esta vontade de preservação da memória que nos leva a reconstruir cidades destruídas tal e qual como foram outrora (casos como Varsóvia, Dresden ou Dubrovnik) . Muito embora o renascimento fac-similado nunca seja a mesma coisa:
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"Há algo de errado em toda aquela correcção. Como se mesmo as perspectivas de profundidade fossem meras fachadas. É muito difícil exprimir através de palavras a calidez, a aura que o tempo autêntico, o tempo enquanto processo vivido, confere ao jogo da luz sobre a pedra, os pátios, os telhados. No artifício do recontruído, a luz tem um travo a néon."
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