quinta-feira, agosto 17, 2006

Ruralidade


Percebi, ao ler este excerto d´O Vale da Paixão da Lídia Jorge porque é que regresso sempre ao sítio onde mora a minha ruralidade. Porque é que hei-de sempre rumar a Figueiró, à Pereira, à Agria.

"Ao contrário dos outros que foram e não voltaram, essa vai mas regressa, regressa sempre. Essa encontra-se presa ao pé boto de Custódio Dias, à mulher dele, às árvores dele, às galinhas desaparecidas, aos últimos ovos, às últimas portas da cancela, aos últimos melins e arreatas, está presa às últimas alfaias da casa. Não se pode salvar. Todas as cartas que vier a escrever serão sobre esses objectos mortos que jazem por terra, que estão pendurados nas paredes, que estão na rua à chuva, nos buracos luarentos dos palheiros, nas geringonças dos sarilhos dos poços, nos alcatruzes das noras, presa das mortes dos criados e das meninas que nelas se afogam, das avencas que fazem molhos verdes e se confundem com o dorso dos sapos (...) Ela está presa ao coração oculto das pedras. Ela nem vai, ela só regressa."