sexta-feira, agosto 04, 2006

Ler ou Reler?

Demorei algum tempo a formar uma opinão sólida sobre isto. O que é que dá mais prazer num livro que nos diz muito? A primeira leitura ou a releitura? O Abel Barros Baptista esteve no programa "Pessoal e ... Transmissível" e deixou-me mais uma vez a pensar nisto. Para ele, mais importante que ler é reler pois o desconhecido inerente à primeira leitura inquieta e inibe-nos de pensar. Um livro excelente será aquele que dá vontade de ler interminavelmente, colhendo sentidos mais profundos em cada abordagem. Na segunda leitura e seguintes, o enredo já não nos inquieta, adoptamos uma atitude mais tranquila, o que nos permite atentar nos pormenores realmente importantes.
Por mim, acho que o verdadeiro prazer só é possível na primeira leitura. Nunca esqueço uma entrevista que vi em que um Professor de Literatura Espanhola, quando questionado sobre que conselhos daria aos alunos que nunca tivessem lido o Dom Quixote responde: "Digo-lhes sempre: que sorte ... que inveja. A vida ainda tem para vos oferecer o prazer de descobrir o Dom Quixote!"
A releitura é um prazer consciente, intelectualizado, uma espécie de amor maduro. Mas a fruição alienante só é possivel no primeiro contacto com o livro e é essa impressão que nos arrebata e que perseguimos nas leituras seguintes, quase como se estivessemos a falar de droga (na verdade, alguns de nós não passam de "leiturodependentes" substituindo haxixe e heroína por livros do Eça, do Tolstoi e outros que tais). Por tudo isto, a memória de um livro pode fazer doer. Mas é essa dor nostálgica e saudosa que nos impele à releitura e nos faz querer recomeçar da página um, perseguindo, na releitura com o intelecto aquilo que a primeira leitura nos disse através do coração.